16 de mar. de 2009

O fascínio das novelas

Nunca fiz nenhum estudo estatístico, mas, empiricamente, ousaria dizer que nove em cada dez brasileiros são fãs de uma boa novela. E aí se incluem homens e mulheres (com primazia delas, claro). E esse fato é perfeitamente compreensível.

O que acontece é que a cultura de massa torna a realidade mais bonita, faz os sonhos, ilusoriamente, possíveis através de um produto rico, sedutor – ainda que inconsistente. Quem de nós nunca se colocou no lugar da moça pobre, trabalhadora, de hábitos modestos que se apaixona pelo homem rico, inteligente, bem vestido – e hetero, claro!- e que consegue realizar esse amor?

E quem nunca pensou: “Isso poderia acontecer comigo!” quando, diante da TV vê a história de um personagem que não nasceu em berço de ouro, mas trabalhou, lutou e conseguiu construir um império, tornando-se rico e poderoso?

Se você é um desses mortais que ri, chora e sonha com as telenovelas padronizadas cujo final é perfeitamente previsível, não se acanhe. Elas são feitas justamente para isso. Produtos típicos da indústria cultural, as novelas são criadas para alimentar desejos e, principalmente, o consumo, que vem na mesma esteira, garantindo o bom funcionamento da máquina capitalista.

E, assim, a indústria cultural vai criando mecanismos de sublimar a dor da impotência, imposta pela dura realidade nacional, através do riso, da lágrima, enfim, da emoção. Usando o amor como pano de fundo, as novelas mobilizam o País com suas tramas rasas, entremeadas de muito sexo, violência, certa dose de romantismo e a certeza de que todos viverão felizes para sempre no final.

Isso acontece porque a gente se reconhece nas telas, vê expostas as nossas mazelas e a superação das mesmas, o que nos dá certo conformismo, afinal, se a vida está ruim agora, vamos continuar lutando que lá na frente tudo se resolve. Essa é a mensagem implícita em toda novela.

Claro que isso não está de totalmente equivocado. Temos que ter fé no labor diário e acreditar que as coisas vão melhorar, o problema é quando as pessoas se regozijam da glamourização da violência, por exemplo, e encaram aquilo que veem na TV como uma verdade absoluta.

Dada a sua penetração, as novelas têm a função de eliminar os pontos de conflitos existentes na sociedade, inserindo os valores já existentes nela de uma forma mais “democrática” em todos os pontos do País, a fim de restabelecer a ordem. E nisso elas são muito eficientes.

Daí a importância de personagens que tragam temas como a gravidez na adolescência e o alcoolismo no passado ou o homossexualismo e a clonagem mais recentemente. A polêmica que tais abordagens trazem é considerada ousadias dos autores e geram reações veementes, no entanto, forçam a discussão e aquilo que era considerado “diferente” passa a fazer parte do cotidiano das pessoas naturalmente.

O fato é que a TV não cria valores, ela reforça o que já existe para tentar reduzir o preconceito e tornar algumas situações que, longe de terem o caráter maniqueísta do que é certo ou do que é errado, são reais e merecem uma discussão.

Considerando essa função social das telenovelas, não se pode apontar o dedo para elas fazendo só críticas. É preciso admitir que elas contribúem para a cultura do povo brasileiro, que são capazes de promover algumas transformações no comportamento das pessoas, mas, mais uma vez, fica o apelo: ao se deleitar diante dessas tramas apaixonantes e envolventes, não esqueça o senso crítico.

Novela não é realidade, por isso, antes de sair por aí reproduzindo o comportamento de seus personagens favoritos ou usarem-nos como justificativa para os seus atos, faça uma análise crítica, desconsidere as cargas exageradas de drama, humor ou suspense e reaja ao que está vendo.

Por mais que queira se aproximar da realidade, as tintas são sempre mais carregadas do que deveriam nas novelas, porque elas fazem parte da categoria entretenimento. Se fossem relatos da vida real, seriam telejornais. Pense nisso!